A crise que se instalou no movimento evangélico Machonaria ganhou novos desdobramentos após a revelação de uma dívida acumulada de R$ 500 mil sob a gestão do pastor Anderson Silva. A informação foi confirmada por ex-líderes da organização, que formalizaram a renúncia coletiva em 19 de maio deste ano. O Vox Livre ja tinha dado detalhes sobre o racha interno e a debandada dos pastores, agora aprofundada pelas denúncias de má gestão financeira.
Fundada em 2018, a Machonaria se apresentava como a maior confraria cristã masculina da América Latina, voltada à formação de homens com base em princípios bíblicos. Contudo, o movimento atravessa seu momento mais delicado. Segundo os pastores que deixaram a instituição, a dívida milionária é resultado direto de decisões centralizadas, falta de prestação de contas, atrasos sistemáticos e contratos não pagos. O centro do problema estaria no chamado “hub social”, sediado em Samambaia Sul (DF), que chegou a abrigar 33 projetos sociais, mas hoje opera com menos de cinco.
O pastor Radamés Morais, ex-vice-presidente da Machonaria, relatou que os atrasos começaram com contas básicas de energia e aluguel. “Fomos nós, da diretoria, que fizemos rateios para evitar corte de luz e despejo. Mas com o tempo, os débitos se acumularam e os pedidos de transparência eram ignorados”, afirmou. O grupo conta que sequer tinha acesso às contas bancárias da instituição. Toda a movimentação era concentrada nas mãos do pastor Anderson.
Acusações incluem calotes, uso indevido de dados e abandono de compromissos
A denúncia mais grave diz respeito ao acúmulo de dívidas com fornecedores, salários atrasados, impostos trabalhistas não recolhidos e orçamentos realizados em nome da instituição que jamais foram pagos. “Havia cobranças de todos os lados. Pessoas com contratos fechados com a Machonaria relatavam que não recebiam. Nós mesmos não sabíamos o que estava acontecendo. Mas o que antes parecia desorganização, revelou-se má gestão intencional”, disse Jhonny Alves, ex-diretor administrativo.
O grupo afirma que tentou reuniões presenciais com Anderson Silva para buscar esclarecimentos, mas não foram recebidos. Em vez disso, o presidente teria abandonado os grupos internos de liderança e ignorado os apelos por diálogo. O resultado foi a renúncia coletiva e a publicação de uma carta aberta denunciando a ruptura com os princípios originais da instituição.
Além das dívidas informadas pelos ex-dirigentes, a Machonaria aparece na dívida ativa da União com um valor de R$ 49.672,29, referente a pendências tributárias e previdenciárias, conforme dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
O caso ganhou ainda mais repercussão após a declaração de Anderson, feita em 2023, de que o movimento havia arrecadado mais de R$ 626 mil naquele ano para custear os projetos sociais. Os valores, no entanto, não bateriam com a estrutura real de funcionamento, segundo os próprios ex-líderes. “Com esse valor, era impensável que estivéssemos vivendo com cortes de luz e ameaças de despejo”, reforça Radamés.
Outro ponto citado pelos pastores diz respeito ao possível uso indevido de dados de terceiros em contratos e financiamentos, o que levanta suspeitas sobre o modelo administrativo da organização.
Pastores apontam manobra na mudança de nome e cobram auditoria externa
Após a repercussão da renúncia em massa e das denúncias, Anderson Silva anunciou em suas redes sociais a mudança de nome do hub social para Instituto Família Silva, o que foi interpretado pelo grupo como uma tentativa de se desvincular das dívidas acumuladas pela Machonaria. “Parece uma jogada para apagar a imagem negativa sem enfrentar os problemas. Mas nós vamos seguir exigindo esclarecimentos e uma auditoria séria”, afirmou um dos ex-integrantes do conselho.
A carta de renúncia, assinada por 18 pastores, afirma que o movimento se desviou da integridade que o originou e que nenhuma missão pode se sustentar sem verdade e transparência. A saída do grupo é descrita como um ato de fidelidade à essência da Machonaria, não uma ruptura com seus ideais, mas com a conduta atual da liderança.
“Me sinto em luto. Investi minha vida, meu tempo, meu dinheiro, minha fé. Não saímos por vaidade ou por divisão, mas por consciência”, declarou Jhonny Alves.
Até o fechamento desta matéria, o pastor Anderson Silva não havia se pronunciado oficialmente. O espaço segue aberto para manifestações.
Matéria baseada em informações originalmente publicadas pelo portal Metrópoles.